Da janela da minha vida

Vi meu
pai chegando

E também
vi lixar, orlar, ‘debruar’…

Eu vi
minha mãe cozendo

A vi
professorar

Eu vi
meu irmão menor chorar

Eu meu
irmão maior se despedir

E meus
irmãos do meio inconsoláveis

A dor
nos partiu sem nos dividir

Vi ele
ir sem nem me ver mais…

Eu vi a
nossa casa vazia com gente transbordando de porta a porta

Antes
escutei voz de gente se lamentando,

era
arraia miúda se misturando

Gente,
eu vi o mundo da minha janela

Eu tive
o mundo em minhas mãos!

Eu vi
meu velho chegando com cofinho de peixe

Eu vi a
minha velha dividir os pães com os vizinhos

E
multiplicar os peixes

Em o
milagre da multiplicação!

De tudo
isso eu tirei belas lições

E sentir
a presença de muita gente amiga chegando pra prosear

Eu vi o
amor nascer e amadurecer

Desta
janela que eu me apego, eu vi o mundo

Eu me
tornei do mundo

Pois eu
nasci para o mundo francamente

Vi meus
avós nos ajudarem

Pedro e
Sinhá se amarem

Eu vi
Bibi pescar e vi Palaio cavalgar

Eu vendi
bolinho na rua

Picolês,
manuês e dindins…

Eu
gritei e pouca gente ouviu

Graças a
muita gente me fiz homem em essências

Eu vi e
ouvi meus pais

Aconselhei-me
com muitos

Seguir
as cartilhas do amor

Eu vi
Itapóã chegar e Zé Bucho ‘anedotar’

Eu vi
Japonês a moça linda namorar

E vi as
primeiras piçarras ‘empiçarrar’

Eu
entendi o dia em que Caiçara chorou

Eu
também vi o sol nascer na rua do sol

E vi o
anoitecer no porto do grupo

E pontão
decolar

Aos
pouco fui me ajeitando no meu eterno lugar

Eu quis
a menina linda namorar

E vendi
pão em jacá

Fui à
festa da melancia para conquistar

E foi
ela o meu grande amor que escolhi para me ajuntar

Eu vi
Zeca Balero estudar

Eu via o
professor dele se admirar

Não dá
para não amar nosso lugar

Eu
também vi canôa velha no porto grande atracar

Pois é
hora de gritar para a pororoca chegar

Tudo
isso eu vi da janela que Deus me fez para dela enxergar

 Nilson
Ericeira