Versos de um retirante

Sairei daqui com mala e cuia

Sem mala nem cuia

Sairei só, sozinho e taciturno

Em solidão eterna

E não me despedirei

Pois em marcas indeléveis

Minhas pegadas são tingidas por letras

Visíveis pra uns

Invisíveis pra tantos

Mas páginas da minha biografia

Fingir, fingi-dor

Mas dor deveras sentir

Incompreendido pois

Antes o meu peito pariu solidão

Agora que já declino

Olho para baixo da escada

Há poucos degraus

Ainda dá tempo de te dizer mais uma vez

Eu te amo!

Te amei, amarei…

Sei, contudo, que este é verso mudo

Pois não produz ecos em ti

Em mim, reverso

Ressonante, pois ainda te escuto

Pois o meu grito insiste

Agora sinto ar rarefeito

Quase pretérito, mais que perfeito

Pois de ti guardo essências de amor e vida

Meus pés, ah meus pés caminheiro!

Descaminham, enroscam-se, tropeço

Voltam-se pro abismo

Já se aproximam uns homens fingidos

Rios de lágrimas derramarão

Mas nunca terão meu perdão

Pois hediondos!

Fingidos, hipócritas que se dizem servos!

Mas por favor, deixem-nos irem

Aqui perto sinto cheiro de enxofre

Devem ser das suas latrinas

Bocas, bocarras…

Insanas e maldosas

Mas senhores acalmem-se

Pois produzo letras

Sou mesmo um fingidor

Finjo até que dor nenhuma há

Pois é só um fingimento de amar

Nilson Ericeira