Carta de alforria

Embora
dê passos, ande, gesticule e reclame

Embora
tenha voz, ando em senzalas

Ainda
que eu tenha o dia e espere à noite

Ainda
que não me alimente somente de pão

E
que não sacie a minha sede só com água!

Mesmo
que tenha um céu prometido

Com
anjos e tudo perfeito

Ainda
assim nada falho se correntes me sufocam

E
se do meu lado alguém sofre e se reprime

Se
a minha crença é inútil e eu me torne um fã à toa

E
do que vale a vida se meus propósitos são egoísticos

Proponho-me
Senhor, a minha carta de alforria

Talvez
liberto eu seja se permitir arbitrário

E
assim não me iludir com cenários

E
nem me esforçar para sorrir

E
ver virtudes onde só há defeitos

E
desse fel não provar

Pois
eu sei que do pior que me fizeram provar

Andei
pecando eu sei, mas não foi por falta de amor

Talvez
muito mais por excesso

E
nesta petição eu te peço que não prendas e nem me repreendas

Pois
se da prisão de que me impões há algo que preste

Eu
detesto, pois viver sem liberdade é não ter asas

E
mesmo quando em outros tempos tivera, feridas com sangue a verter

Por
essa razão, e tantas outras que me incluo a desafiar, viver não é morrer

Mas
lutar para que amarras não se tenha

Então,
eu prometo, que logo que me liberte

Melhores
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 Nilson
Ericeira