Eu me
lembro muito bem,
Meu pai
batendo o martelo
Eu,
consertando o chinelo
Meus
irmãos engraxando
A cola,
a tinta, o verniz
Agora só
saudades do meu coração
O
corta-bico, a torquês, tudo no prumo
É
preciso cozer e costurar
A bola
em fatias o gomos
Tudo
pontuado em barbante, cera e jeito
A minha
cabeça doía
Eu era o
teste, tocando a bola da vida
Pois o
meu velho sapateiro nos tornara aprendizes
Assim
pontuamos a nossa vida
O
tabuleiro velho era o nosso banco
Ao
redor, uns meninos franzinos
Na
cozinha, a temperatura esquentava
E
exalava na casa comida de mãe
E, aos
poucos, saciávamos nossas fomes
No
debruar da vida, o amor
Enquanto
nos espiava a onzena botafoguense
Da visão
à ilusão
Não se
podia alimentar do que não se tinha
‘Mãequitinha’
brava mulher
A tudo
resistiu para sua prole
E assim,
o tabuleiro de sapateiro
Enroscado
de cola por todos os vãos
O
afiador, o bate-ferro, o pôncio
No meio
da sala, a máquina velha esquerda
E roda,
e quebra agulha dezesseis
Nomes
profanos: pornofonias
Era uma
agonia
No meio
da rua, com sol em pino
Os
cachorros velhos latiam
Indiferentes
à vida que tinha
Ericeira
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