Coisas da minha vida ou páginas da minha biografia I

Por Nilson Ericeira

Poeta, escritor – jornalista – professor – psicopedagogo e advogado

Toda criança gosta de brincar! As brincadeiras de infância são fundamentais para a formação da criança, Não à toa idealizam a partir de seus mundos outros mundos. O mundo para as crianças vai até onde a imaginação der.

Gostava de brincar e idealizar mundos, foi assim que fui muito feliz na minha infância. Porém, abro um parêntese, sem nenhuma anotação gráfica em que possa recobrar a minha memória antiga, mas com bastante precisão sentimental, ou melhor, inteligência emocional, para contar-lhes coisas minhas. Tomara que não interesse só a mim, como me parece.

Você pode perceber uma ligeira fuga ao assunto, peça condenável nas redações, mas ainda bem que retomei a minha real intenção.

Nasci na Rua da Franca em Arari, na década de 60, e quando eu tinha apenas dois anos de idade, contam que em Arari teve um das maiores cheias, nossos pais eram pobres, minha mãe trabalhava no lar, meu pai era sapateiro e também buscava sustento do Rio Mearim. Já éramos quatro irmãos, depois nasceram mais quatro, dois não sobreviveram.

Ainda que a vida nos parece pequena, dadas as dificuldades, éramos felizes. Conta-me a minha mãe que eu fui ‘aparado’ por dona Áurea, uma conhecida parteira de Arari, que muitas vidas recepcionou. Ali na rua da Franca éramos abastecidos de amor, os vizinhos, os parentes, os amigos, todos nos socorriam na hora da precisão. Contou-me ainda a minha mãe Elieisita Ericeira que Tereza de Azim, parente, amiga e comadre, e dona Biô (de saudosa memória) nos sustentaram com leite materno, foram as nossas mães de leite. Assim rompemos a pobreza material e um impaludismo em plena Cheia de 1964. Aqui fomos socorridos ou salvos por Tonico Santos, pelos enfermeiros Jorge Oliveira, Marcelino Lima, João Pires e pelo médico de Arari, João Lima, com a intercessão de Deus. É que a minha imã Terezinha (saudosa Têca), ardia também em febre alta. “Olha só os meninos, só a pele e ossos”, diziam uns. “De hoje não escapam”, diziam outros.  

Contexto em que lembra-me a minha mãe, que meu pai armazenara botinas de couro búfalo, para vendê-las no inferno, uma espécie de especulação na pobreza, pois a demanda aumentava tão logo o inverno chegasse.  Tivera o meu bom sapateiro que desfazer-se de todo o estoque por um preço mais baixo, tudo para salvar as crianças. Como eu não poderia me apegar tanto a meu pai Clecy!

As águas cresciam, era preciso refazer o girais, aos poucos a febre cedia, os meninos se alimentavam, o doutor João Lima (de saudosa memória) medicava, Tonico Santos curava e passava os medicamentos, João Pires aplicava. Contexto em que não faltara solidariedade e amor ao próximo, coisa rara em nosso tempo. Olha por que eu chamava João Pires (de saudosa memória) de meu irmão! No que ele respondia prontamente!

Com o tempo, os meninos já riscavam o chão das ruas de Arari, teciam os fios da vida!

Nossos pais são exemplos de dignidade e amor ao próximo e nós assimilamos valores muito especiais em nossas vidas. Assim, contei um pouco da minha própria vida, não por sensacionalismo ou ato afim, mas para reconhecer pessoas, ao tempo em que externar gratidão a pessoas muito importantes em nossas vidas.